Terça-feira, 21 de janeiro de 2025
Por Redação Rádio Caiçara | 4 de dezembro de 2023
O tradicional almoço de confraternização da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) transcorreu num clima de relativo alívio com o cenário macroeconômico — diferente do que se viu no ano passado, com as incertezas que pairavam às vésperas da troca de governo. Há uma percepção de que a inflação está sob controle e que o risco fiscal existe, mas não é alarmante. O prato indigesto, desta vez, veio do próprio quintal: a discussão sobre o rotativo do cartão de crédito e o parcelado sem juros.
O setor corre contra o tempo para encontrar uma solução que evite o tabelamento de juros imposto pela lei do Desenrola — o pior dos mundos para os bancos. As instituições financeiras têm menos de um mês para apresentar uma proposta ao Conselho Monetário Nacional (CMN). Mas as conversas com executivos sugerem que não há nem sinal de consenso e que há uma certa expectativa de que o Banco Central (BC) regule a questão.
A questão do rotativo foi comentada no palco pelo presidente da Febraban, Isaac Sidney, e assunto nas mesas e rodinhas de graduados executivos do setor. Comandando um “talk show” durante o almoço, o diretor de comunicação da entidade, João Borges, provocou o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, a falar sobre o tema — e ele não se furtou a falar sobre o assunto, embora não tenha dito o que pretende fazer.
“Talvez o problema aqui é que a gente esteja olhando muito o curto prazo”, disse Campos. “Meu medo é [os setores envolvidos, ou seja, bancos, credenciadoras e varejistas] estarem olhando muito o curto prazo e não estarem percebendo que talvez a gente pudesse ter um crescimento como um todo maior do crédito, mais sustentável. E a ponta que está preocupada hoje em vender menos poderia estar vendendo mais, de forma mais sustentável.”
Campos destacou que o uso do parcelado sem juros aumentou muito, enquanto o CDC, linha tradicional de financiamento ao consumo, fica “um pouco parado”. Ao mesmo tempo, disse, o mercado de desconto de recebíveis de cartões tornou-se muito grande e as taxas de desconto são maiores do que “a precificação que seria o risco do emissor”.
Para Sidney, está faltando “sensatez” no debate. Segundo ele, a solução que veio do Congresso — limitar os juros a 100% do valor principal da dívida — não resolverá o problema e criará distorções na oferta e na demanda.
O presidente da Febraban reiterou que os bancos não querem o fim do rotativo nem do parcelado sem juros, mas disse que há uma questão de risco de crédito a ser resolvida. Citando dados do BC, ressaltou que, no modelo atual, 15% do volume da carteira de crédito de pessoa física não paga juros e que 75% dos recebíveis de cartões não são remunerados. “Não consigo enxergar que a Febraban faça qualquer acordo que não passe por uma limitação do parcelado sem juros”, disse a jornalistas no fim do encontro.
Sidney também deixou claro que espera que o BC organize uma solução para o impasse. Também em conversa com jornalistas, afirmou que essa é uma questão prudencial, ou seja, que diz respeito ao capital bancário — e, portanto, é da alçada do regulador.
“Não estou dizendo que o Banco Central vai acolher nossa proposta de limitação do parcelado sem juros, mas do ponto de vista prudencial precisa encontrar alguma solução para que a gente possa ter um freio de arrumação e evitar que esse empilhamento de prestações continue sem qualquer limitação”, disse.
O executivo deixou a porta aberta para uma sugestão que está na mesa: a de que, quando um cliente cair no rotativo, o emissor possa cobrar juros sobre as parcelas ainda a vencer, numa espécie de composição de dívida. No entanto, observou que isso só pode ser feito se houver adesão voluntária do cliente. Ou seja, não resolve todo o problema.
Antes e depois do almoço, executivos do setor também manifestaram preocupação com a questão do rotativo e com a falta de um acordo. Há também uma expectativa em relação à atuação que terá, nesse front, o novo presidente do Bradesco, Marcelo Noronha. O executivo conhece bem o setor de cartões e já esteve à frente desse debate em outros momentos.
No Ar: Caiçara Confidencial