Sábado, 01 de novembro de 2025
Por Redação Rádio Caiçara | 1 de novembro de 2025
No dia 7 de outubro deste ano, na estepe da Patagônia argentina, ocorreu um episódio memorável, que poderia ser descrito como um dos mais espetaculares da paleontologia moderna — não apenas pela raridade da descoberta, mas porque foi transmitido ao vivo, para milhares de espectadores do YouTube.
Um dos pesquisadores da escavação no sítio de Rio Negro contou: “Encontramos um pequeno ninho. Estávamos caminhando com nosso companheiro e pensamos: ‘Será que isso [o ovo] é de uma ema?’ E quando começamos a desenterrá-lo, descobrimos que estava cheio de terra. Isso é absolutamente insano”.
No vídeo da chamada Expedición Cretácica I — que viralizou imediatamente nas redes sociais — o líder da pesquisa, Federico Agnolín, identificou a descoberta como um ovo de dinossauro. Como o local é conhecido por descobertas fósseis de dinossauros carnívoros, é possível que o ovo pertença a um terópode.
A descoberta chamou a atenção pela sua raridade: ovos de dinossauros carnívoros são muito mais difíceis de encontrar e conservar do que os de herbívoros, porque suas cascas tendem a ser mais finas e mais vulneráveis à erosão. Não por acaso, as aves, herdeiras evolutivas dos terópodes, possuem esse mesmo padrão de casca.
O estado de preservação, considerado pelos paleontólogos do Conicet (Instituto Nacional de Ciências Naturais, da Argentina) como “quase perfeito” ou “intacto”, é notável para um fóssil de cerca de 70 milhões de anos, e permite muitas oportunidades para estudo microanatômico, principalmente se contiver um embrião.
A Patagônia argentina é um dos territórios mais ricos em depósitos fósseis do mundo. Foram encontrados naquela região alguns dos maiores dinossauros que já andaram pela Terra, como o Argentinosaurus, saurópode pescoçudo comedor de plantas, e o carnívoro Giganotosaurus.
No sítio paleontológico de Rio Negro, onde foi localizado o ovo de dinossauro, foi encontrada, em 2024, a garra do Bonapartenykus ultimus, um dinossauro carnívoro endêmico da Argentina. Além disso, foram identificados restos de outros fósseis, incluindo mamíferos primitivos, répteis menores e ninhadas de dinossauros.
Embora o ovo tenha se tornado uma trend nas redes sociais, a Expedição Cretácica I foi bem-sucedida em outras frentes. Entre os achados estão dentes de mamíferos primitivos, vértebras de serpentes ancestrais, mandíbula de hadrossauro (o dinossauro “bico de pato”), restos de um pequeno saurópode, além de sementes, folhas e cones.
Para o técnico em paleontologia de vertebrados Gonzalo Leonel Muñoz, do Museu Argentino de Ciências Naturais, “essa abundância nos permite descrever uma biota inteira e compreender como era a vida em todos os sentidos no final da era dos dinossauros”, afirma ele à National Geographic.
Muñoz lembra que “a Patagônia é uma janela excepcional para o período próximo ao final da era dos dinossauros, há cerca de 70 milhões de anos. Parte do antigo supercontinente Gondwana, representa um experimento evolutivo único, com faunas particulares que não existiam em outros lugares”.
O “ovo bem preservado”, com uma ornamentação típica de um grupo de dinossauro visível na superfície da casca, foi exibido via streaming ao público conectado. O momento conseguiu unir emoção da descoberta à divulgação científica, o que é um dos compromissos do Conicet na campanha.
Sobre a possível existência de um embrião, Muñoz mostrou cautela ao abordar o assunto: “Um embrião é um organismo muito delicado e sua preservação é complexa. Embora o ovo tenha se preservado completo, não sabemos se havia um embrião que morreu, ou se era um ovo não fertilizado”, disse.
O próximo passo da expedição será submeter o fóssil a microtomografias e tomografias computadorizadas de alta resolução para revelar seu interior sem danificar a estrutura. Se confirmada sua existência, um embrião fossilizado poderia esclarecer algumas questões fundamentais sobre a biologia reprodutiva dos terópodes.
Os pesquisadores esperam identificar o grupo específico ao qual o ovo pertence, compreender o desenvolvimento embrionário e o estágio de eclosão, além de revelar aspectos da evolução de dinossauros para aves — lacunas cruciais na história evolutiva desses animais.
Muñoz destacou as possibilidades científicas de um possível embrião na entrevista à National Geographic: “Pode acontecer que vejamos uma linhagem que ainda não conhecemos, ou que entendamos que tipo de ovo alguns dos dinossauros comuns dessa época punham, perto do final da era dos dinossauros na Patagônia argentina”.