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Por Redação Rádio Caiçara | 16 de março de 2023
O senador Alessandro Vieira (PSDB-SE) ingressou com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para obrigar o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), a retomar imediatamente o rito constitucional das medidas provisórias (MPs). No mandado de segurança, o senador menciona um ato assinado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que restabelece a tramitação ordinária e a instalação das comissões mistas para todas as MPs editadas a partir de 1.º de janeiro.
Há mais de um mês, Lira protela a assinatura desse ato, atitude que explica, em parte, a letargia que tem marcado os trabalhos do Congresso neste ano. Não é coincidência que nada de útil tenha sido apreciado pelos parlamentares desde o início da nova legislatura: enquanto Lira não firma o ato, Pacheco se recusa a enviar as MPs à Câmara. Assim, quase 30 medidas provisórias estão paradas, 11 das quais editadas pelo presidente Lula da Silva, e algumas podem perder validade se não forem deliberadas até abril.
Na ação, Vieira acusa Lira de cometer ato “ilegal e abusivo consubstanciado na inércia da autoridade coautora” e “flagrante atentado” contra o texto constitucional. “A Constituição estabelece um regime específico para a tramitação de Medidas Provisórias, e o que atualmente acontece é uma subversão desse regime por uma determinação e um capricho do presidente da Câmara dos Deputados”, afirmou Vieira, em discurso no Senado.
Tem toda a razão o senador, mas é surreal que ele tenha de recorrer ao Supremo para garantir o cumprimento de algo que a Constituição definiu de forma tão cristalina. Fruto de emenda constitucional de 2001, o artigo 62 menciona expressamente as comissões mistas, compostas por igual número de deputados e senadores, como as responsáveis por emitir parecer antes que os textos sejam submetidos ao plenário da Câmara e do Senado.
O mesmo assunto já foi tratado pelo STF há exatos 11 anos. Em março de 2012, o STF determinou à Câmara e ao Senado que respeitassem a Constituição e adotassem, obrigatoriamente, a instalação de comissões mistas para toda medida provisória. É função desses colegiados analisar se as MPs cumprem os pressupostos de relevância e urgência que asseguram sua edição por parte do Executivo, analisar o mérito das propostas e elaborar o parecer que irá a votação em plenário.
Na pandemia de covid-19, para evitar aglomerações e proteger os parlamentares, esse procedimento foi revisto. Além de permitir deliberações a distância, o Congresso suspendeu as comissões mistas e passou a analisar as MPs diretamente em plenário. O mais interessante é que um dos fatores considerados pelos ministros do STF no caso julgado em 2012 foi a mesma “polêmica” que voltou à tona neste ano: mudanças profundas no teor das medidas provisórias, aprovadas por meio de emendas propostas em plenário, sem que houvesse uma “reflexão mais detida” em comissão, segundo mencionou o voto do ministro Luiz Fux.
Pelo rito constitucional, as emendas às MPs são apresentadas na etapa da comissão mista. O relator pode ou não acatá-las sem seu parecer e, caso elas não sejam acolhidas, os parlamentares podem destacá-las em plenário, desde que elas já tenham sido apresentadas à comissão. Não é permitido, no entanto, apresentar novas emendas à MP na fase de plenário – e é contra isso que se insurge o presidente da Câmara.
O rito expresso pandêmico deu a Lira poder para alterar leis em tempo real, no momento em que as MPs entravam na pauta das sessões. O protocolo também assegurou à Câmara não só a primeira, como a última palavra sobre as MPs, já que alterações feitas pelo Senado poderiam ser retiradas da redação final sem dificuldades – como foram em muitas ocasiões nos últimos três anos.
A pior fase da pandemia de covid-19, felizmente, foi superada. Já não há mais nada a amparar a conduta de Lira ou a continuidade deste rito excepcional de tramitação de medidas provisórias. Nesse caso, não há decisão nem acordo possível que não passe pelo simples cumprimento da Constituição e pelo retorno das comissões mistas.
No Ar: Show da Tarde