Segunda-feira, 13 de janeiro de 2025
Por Redação Rádio Caiçara | 4 de dezembro de 2023
O volume de recursos originado no mercado de capitais superou, pela primeira vez na história, a participação da poupança na estrutura de “funding”, ou seja, das fontes de recursos para o crédito imobiliário.
Dados da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) mostram que os instrumentos de financiamento privado, como certificados de recebíveis imobiliários (CRI), fundos imobiliários (FII) e os títulos de captação bancária, como as letras de crédito imobiliário (LCI) e as letras imobiliárias garantidas (LIG), aumentaram a participação na estrutura de funding de 24% no fim de 2021 para 38% no término do primeiro semestre de 2023, com saldo total de R$ 787 bilhões. Nesse mesmo período, a fatia da poupança encolheu de 49% para 36%, com estoque de R$ 738 bilhões.
Mesmo com as saídas líquidas da caderneta, o total de recursos disponíveis às linhas de financiamento aumentou em 27% de 2021 para cá. O montante subiu de R$ 1,62 trilhão há dois anos e meio para R$ 2,06 trilhões no início da segunda metade de 2023.
As estatísticas são um sinal inequívoco de que o crédito imobiliário brasileiro vem passando por uma transformação estrutural nos últimos anos. Da mesma forma que especialistas têm tentado encontrar explicações para a surpreendente força da economia mesmo em ambiente de taxas de juros tão restritivas, o financiamento habitacional segue caminho semelhante: o setor tem mostrado resiliência que não encontra paralelo nos ciclos anteriores de aperto monetário.
Segundo projeções da Abecip, a concessão de novos empréstimos para aquisição da casa própria deve fechar 2023 com o terceiro melhor volume da história, atrás apenas de 2021 e 2022. “Nesses últimos três anos, o mercado imobiliário mudou de patamar no Brasil, seja no crédito imobiliário ou em comercialização”, afirma o diretor de negócios imobiliários do Santander, Sandro Gamba, recém-eleito presidente da entidade para o biênio de 2024 a 2025.
A Abecip estima que o setor vai fechar o ano com uma produção de R$ 156 bilhões para operações com recursos da poupança (SBPE). Se confirmada, a cifra coloca o período atual bem à frente de 2020, que ocupa o quarto lugar na lista de melhores anos, quando os novos financiamentos alcançaram R$ 124 bilhões.
O volume surpreende também porque os patamares nos anos pré-pandemia se situavam muito abaixo da produção atual. De acordo com a série histórica da Abecip, o pico do período antes da crise da covid-19 ocorreu em 2014, quando o mercado concedeu R$ 112,85 bilhões em financiamentos imobiliários.
Na visão de especialistas, houve uma conjunção de fatores que tornaram o crédito mais sustentável mesmo em condições difíceis. Para as instituições financeiras, o desenvolvimento do mercado de capitais possibilitou que os recursos continuassem a fluir para as linhas de financiamento habitacional mesmo com o alto volume de saídas líquidas da poupança, a principal fonte de dinheiro para essas linhas.
Essa contribuição não foi trivial. Entre 2022 e 2023, as condições negativas foram tão severas que poderiam ser vistas quase como um teste de estresse para o sistema de crédito imobiliário com recursos da poupança.
O juro básico atingiu a máxima do último ciclo de aperto monetário, de 13,75% ao ano, em agosto de 2022 e só começou a baixar um ano depois. Além disso, o maior volume de saída líquida da história da caderneta, segundo dados do BC, ocorreu no ano passado. O período atual caminha para ocupar o segundo lugar desse pódio.
A restrição de recursos na poupança atinge diretamente o crédito imobiliário. Isso porque há previsão em lei de direcionamento obrigatório de 65% do saldo do instrumento para as linhas de financiamento da cadeia habitacional, seja na aquisição da casa própria ou para custear obras. A caderneta, que tem remuneração para os aplicadores de 0,5% ao mês mais a variação da Taxa Referencial (TR), funciona como o funding de menor custo, essencial para que os empréstimos possam manter taxas acessíveis.
Em 2021, a poupança registrou saques líquidos, ou seja, a diferença entre as entradas e saídas de recursos, de R$ 35,5 bilhões. No ano seguinte, houve retiradas líquidas de R$ 103,24 bilhões. Em 2023 até setembro, a aplicação tradicional viu evaporar mais R$ 86,13 bilhões.
Nos três últimos anos, a sangria de recursos alcançou R$ 224,87 bilhões, segundo dados do BC. Como atenuante, em 2020, em meio às medidas de isolamento e, consequentemente, restrições ao consumo, a poupança registrou uma entrada líquida recorde de R$ 163,31 bilhões. No entanto, esse saldo positivo foi totalmente consumido de 2021 até início de 2023. No momento atual, o déficit já alcança R$ 61,56 bilhões.
Em compensação, o mercado de capitais apresentou forte crescimento, como indicam os dados da Abecip, e passou a ocupar parte do espaço deixado pelo recuo da caderneta na estrutura de funding.
“Hoje, em todos os principais bancos que fazem crédito imobiliário, a carteira imobiliária está bem superior à captação de poupança, sendo necessário usar funding alternativos de tesouraria como LCI e LIG, por exemplo, para complementar os financiamentos imobiliários”, diz o diretor de crédito imobiliário do Bradesco, Romero Albuquerque.
No Ar: Show da Tarde