Quarta-feira, 09 de outubro de 2024
Por Redação Rádio Caiçara | 24 de junho de 2023
Durante a sua passagem pela Europa, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a criticar, nesta sexta-feira (23), condições que a UE (União Europeia) acrescentou ao tratado que busca a integração com o Mercosul. Na visão do brasileiro, a carta enviada pelo bloco europeu faz “ameaça” a um parceiro estratégico.
Especialistas afirmam que o descontentamento do presidente com acordo está ligado a dificuldades comerciais e industriais que o país enfrentaria ao acatar as condições impostas pela UE.
“O que acontece é que tem pontos que são inaceitáveis ou ameaçam, porque implicam em questões bastante severas ao meio ambiente”, explica a professora Regiane Bressan. O acordo entre Mercosul e União Europeia vem sendo discutido exaustivamente desde 1999 e chegou a ser assinado em 2019, durante o governo de Jair Bolsonaro.
No entanto, em março deste ano, a UE enviou um documento que reabriu as negociações e passou a exigir compromissos ambientais para desbloquear o acordo de livre comércio entre as nações.
“A União Europeia está totalmente alinhada aos acordos de Paris e aos acordos ambientais das organizações multilaterais, mas impor isso neste acordo vai dificultar muito para que o Brasil consiga, de fato, fazer comércio […]. Exigir que todo produto tenha inspeção, selo verde… Nem tudo a gente vai conseguir, esse é o ponto”, complementa a especialista.
Em uma visão semelhante, o professor de Relações Internacionais Leonardo Trevisan compara as novas demandas dos europeus como mudar as regras do jogo com a partida em andamento. “Agora, todos os produtos comprados pela UE terão que obedecer a uma nova regra de desmatamento regular, com data retroativa. Isso cria uma dificuldade enorme para a exportação brasileira”, explica.
Na visão de Trevisan, por trás das condições, estão os interesses do agronegócio europeus, sobretudo dos franceses. “Eles, evidentemente, têm uma poderosa indústria láctea, mas que é de menor produtividade do que a indústria láctea brasileira”, explica. “Se o Mercosul conseguir uma abertura para entrar no mercado europeu, os franceses e outros países menores da União Europeia vão perder espaço”, diz.
Além das questões ambientais, outro ponto que incomoda o presidente Lula está ligado à industrialização — questão muito levantada pelo petista ainda durante a campanha presidencial e que poderia sofrer implicações.
“Não digo que o acordo impediria uma nova industrialização, mas ele cerceia e implica uma industrialização vinculada ao desenvolvimento sustentável”, explica Bressan.
Além disso, a professora afirma que, no que diz respeito às compras governamentais, o novo acordo poderia levar o Brasil a perder concorrência para empresas europeias devido à estatização de áreas estratégicas.
“Não que o governo não possa desestatizar, mas ele pode vender para empresas nacionais. Ele não precisa necessariamente vender para empresas europeias. Quando abrimos a concorrência, ficamos muito mais vulneráveis”, conclui.
O governo brasileiro tem expectativa de que pode haver uma janela para avanço do acordo no segundo semestre deste ano, quando a Espanha — um dos maiores entusiastas da parceria dentro do bloco europeu — assume a presidência do Conselho da União Europeia.
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