Segunda-feira, 02 de dezembro de 2024

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Voltar Desde que a Rússia invadiu a Ucrânia, existe uma preocupação do povo ucraniano em proteger seus bens culturais

Desde que a Rússia invadiu a Ucrânia, na semana passada, cada dia de guerra é também um dia de preocupação do povo ucraniano – e do resto do mundo – em proteger os bens culturais daquele país. Na tarde da última terça-feira, o ataque russo que destruiu a principal torre de transmissão de rádio e TV da capital Kiev por pouco não atingiu o Babi Yar, memorial do Holocausto localizado próximo ao local onde fica a antena. Foi lá que, em 1941, mais de 34 mil judeus foram fuzilados pelos nazistas em apenas dois dias. Mas, assim como o Babi Yar, outros lugares importantes para a arte, a cultura e a história da Ucrânia estão sob risco em meio ao bombardeio das forças russas.

No domingo, o Ministério de Relações Exteriores ucraniano divulgou comunicado afirmando que 25 obras da pintora Maria Prymachenko (1908-1997), uma das artistas mais famosas do país, estavam em risco por conta de um incêndio no Museu de Ivankiv, causado, supostamente, em decorrência do conflito.

Não há registros, por enquanto, de prejuízos significativos em prédios culturais importantes, como a Filarmônica de Kiev, a Academia Nacional de Música Tchaikovsky e a Biblioteca Nacional Parlamentar, que chegou a perder 300 mil itens após ser incendiada pelos nazistas em 1943. Desde a Segunda Guerra Mundial, se criou na Convenção de Haia, em 1954, o Escudo Azul – algo semelhante à Cruz Vermelha, mas voltado para proteção de bens culturais. O Conselho Internacional de Museus (Icom), órgão vinculado ao Comitê Internacional do Escudo Azul, emitiu nota oficial expressando preocupação diante da situação na Ucrânia: “O Icom está especialmente preocupado com os riscos enfrentados pelos profissionais dos museus, bem como com as ameaças ao patrimônio cultural por causa desse conflito armado”, dizia a nota.

Segundo o jornal britânico The Guardian, Fedir Androshchuk, diretor do Museu Nacional da História da Ucrânia em Kiev, disse por e-mail a um colega acadêmico que quatro museus do país, em Vinnytsia, Zhytomyr, Sumy e Chernihiv, “conseguiram proteger suas exposições” e que não havia relato de saques ou ataques a estas instituições. Mas não há garantias de que isso se mantenha. O próprio Museu Nacional da História da Ucrânia, chefiado por Androshchuk, corre risco por estar localizado próximo a prédios públicos ligados à segurança ucraniana.

Outro local ameaçado é o Museu Nacional de Arte da Ucrânia, que também está perto de edifícios do governo que podem ser alvos de um ataque russo a qualquer momento. Em 2014, durante a Revolução Ucraniana, que registrou violentas manifestações de protesto contra o governo do presidente eleito, Viktor Yanukovych, um coquetel molotov chegou a atingir o telhado do museu, mas o fogo foi controlado e não houve perdas. De acordo com o Wall Street Journal, pouco antes de a invasão russa acontecer, o Ministério de Cultura e Política de Informação da Ucrânia emitiu diretrizes para possível proteção e evacuação das coleções dos museus.

O crítico e professor de História da Arte Rodrigo Naves lembra do caso específico de um museu que conseguiu proteger parte de suas coleções durante bombardeios.

“Em Berlim, o Museu Pérgamo, que é lindo e tem uma importante coleção de arte grega, foi gravemente atingido durante a Segunda Guerra Mundial, mas ainda assim preservou boa parte do acervo. Tudo foi posto em porões. Havia um procedimento em casos de guerra que consistia em envolver as esculturas com areia, para que o impacto das explosões não destruísse as obras. No Louvre, em Paris, também foi feito um trabalho de proteção memorável”,  afirma Naves.

Para Mauro Trindade, professor de Teoria e História da Arte do Instituto de Artes da UERJ, ainda que seja inevitável alguma perda, a proximidade histórica e cultural entre Rússia e Ucrânia pode ser um indicador de que os danos serão reduzidos.

“Os museus estarão mais bem protegidos do que pequenas igrejas, por exemplo, mas ainda assim haverá prejuízo. Mas acho que não existe sentimento iconoclasta entre russos e ucranianos, não deve haver saques premeditados pelos russos. Eles são culturalmente muito próximos, a cultura eslava e a igreja ortodoxa são presentes nos dois países. Não vejo um projeto sistemático de destruição da arte ucraniana”, diz o professor.

Ele também lembra do Louvre para enaltecer o trabalho das equipes dos museus em tempos de guerra: “No momento que a França se rendeu, Hitler pegou um avião e foi direto para o Louvre. Aparentemente deram sumiço em grandes obras, mas houve um cuidado heroico de todos os funcionários do museu”.

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