Quinta-feira, 12 de dezembro de 2024

Quinta-feira, 12 de dezembro de 2024

Voltar Argentina sofre com a falta de dólares e isso afeta as exportações brasileiras para lá

A instabilidade cambial resultante da corrida presidencial na Argentina acentuou a perda de espaço dos produtos manufaturados nas exportações brasileiras ao país vizinho. Os bens da indústria de transformação ainda predominam nas vendas para aquele que é o maior parceiro brasileiro comercial na América do Sul, mas as indústrias brasileiras apontam dificuldades maiores neste ano, dado por mais entraves burocráticos aos embarques e maior dificuldade de acesso a divisas pelas empresas argentinas.

De janeiro a outubro deste ano, os manufaturados representaram 91,1% dos embarques aos argentinos, fatia 1,6 ponto percentual abaixo da de 2022. Em 2019, há menos de cinco anos, a fatia era de 95,7%, considerando sempre os mesmos dez meses, segundo a Secretaria de Comércio Exterior. As comparações desconsideram os embarques de soja, que tiveram comportamento atípico em 2023 e lideraram este ano a exportação brasileira ao país vizinho.

Maior parceiro regional, com 5,3% das exportações brasileiras e terceiro lugar no ranking de todos os destinos do Brasil, a Argentina deve escolher seu próximo presidente neste domingo e a expectativa pelo resultado das urnas é compartilhada pelos brasileiros, apontam especialistas.

A Argentina atravessa um momento de crise e possui baixas reservas cambiais, o que levou o país vizinho a adotar uma postura mais protecionista, em que há várias taxas e embargos a produtos externos, diz Welber Barral, sócio da BMJ e ex-secretário de Comércio Exterior. “Além do controle cambial, o problema da Argentina são as estreitas licenças de importação, que afeta também as suas exportações, porque se tem altos impostos de importação.”

Igor Fink, economista e analista de inteligência de mercados da Abicalçados, que reúne a indústria calçadista brasileira, conta que desde o fim do ano passado os calçados, que historicamente contavam com licença de importação liberada automaticamente para entrar no mercado argentino, caíram no rol dos produtos com licença não automática. Isso significa que o produto espera a aprovação para ingressar na Argentina por prazo de até 60 dias.

Esse, explica Fink, é o prazo máximo estabelecido pela Organização Mundial do Comércio (OMC). Mas os calçados brasileiros enfrentam uma espera muito maior. No último levantamento do setor, havia no início de outubro 584 mil pares de calçados à espera de liberação para entrar na Argentina. A demora, diz o economista, compromete a venda do produto, já que muitas vezes os calçados chegam às vitrines fora da temporada.

Após liberada a licença para o desembarque em território argentino, diz Fink, os desafios continuam, porque há prazo de 180 dias para o importador argentino acessar o mercado de câmbio, o que esbarra no desafio de conseguir comprar dólares. Segundo Fink, os relatos de inadimplência entre os fornecedores brasileiros têm aumentado.

Nesse cenário, algumas indústrias brasileiras desistiram de vender calçados aos argentinos, ficando apenas as empresas maiores, que possuem parcerias comerciais de longa data e que têm maior fôlego financeiro. Isso, ao lado da concorrência com calçados da China e de países do Sudeste asiático, fez a participação do Brasil nas importações argentinas de calçados cair de 49% em maio deste ano para 39% atualmente. A perspectiva, estima Fink, é que ao fim do ano a fatia caia para 31%.

Edgard Dutra, diretor da Metalplan, indústria de bens de capital, diz que a empresa tem parceria com um distribuidor argentino de equipamentos que fornece máquinas também para a área de saúde. Isso provavelmente favoreceu os embarques de compressores a ar fabricados pela empresa nos últimos anos, avalia. O mesmo distribuidor argentino também tem operações de exportação, o que deve facilitar o acesso a dólares.

Mesmo assim, Dutra conta que este ano enfrentou maior dificuldade para embarque ao país vizinho. “O pedido do parceiro argentino entrou em maio e conseguimos finalizar a produção no início de julho. Aí começou uma novela e ficamos de agosto até quase fim de outubro sem conseguir embarcar as máquinas para a Argentina”, lembra. Houve, diz, várias dificuldades, como as burocráticas, que demandaram muitas reuniões entre os despachantes dos dois lados para validar a documentação necessária. “E quando finalmente a documentação foi submetida à alfândega argentina, aconteceu algo que eu nunca havia visto em quase 25 anos de exportação. Pediram para remover itens porque o valor estava acima do que seria possível liberar”, conta. “Tivemos que remover cerca de 10% do total de máquinas, que vão esperar uma nova leva de embarques.”

Apesar das dificuldades, Dutra diz que o mercado argentino se mantém importante para a empresa, com 30% da exportação. A empresa tenta intensificar embarques a Chile e Peru e planeja retomar vendas à Colômbia.

Mesmo após intensa corrida presidencial, as relações comerciais Brasil-Argentina não devem sofrer significativas alterações em 2024, avalia Barral. Em um pleito marcado pela polarização, ele diz que os candidatos não terão condições de fazer grandes mudanças na linha comercial do país.

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No Ar: Show da Tarde