Sexta-feira, 13 de dezembro de 2024

Sexta-feira, 13 de dezembro de 2024

Voltar Almirante que comandava a Marinha do Brasil foi deixado sozinho após delação do tenente-coronel Mauro Cid em relato sobre tentativa de golpe

Uma fotografia, a primeira, publicada em 14 de junho de 2021, mostrava o espírito do mais novo oficial tuiteiro do governo de Jair Bolsonaro. “As Forças Armadas são uma grande família a serviço da Pátria e assim vão permanecer até o fim dos tempos; sempre estarão unidas sob a direção do ministro da Defesa. Que ninguém se engane!” A imagem estava na então recém-aberta conta do Twitter do almirante Almir Garnier Santos, nomeado dois meses antes para comandar a Marinha. Atualmente, o ex-comandante foi deixado sozinho após delação do tenente-coronel Mauro Cid.

Na foto, além do marinheiro, estavam o então ministro da Defesa, general Walter Braga Netto, futuro candidato à vice-presidência na chapa de Bolsonaro, e os então comandantes do Exército, general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, e da Aeronáutica, Carlos de Almeida Baptista Júnior.

Os quatro formaram a cúpula militar depois da crise que levou à demissão dos chefes anteriores, em março de 2021. Todos iriam desempenhar papéis importantes em outra crise: a que se seguiu à derrota do chefe na eleição de 2022.

Braga Netto buscava manter o ânimo dos bolsonaristas após a derrota. Paulo Sérgio, promovido a ministro da Defesa, pilotava a tarefa de “fiscalizar as urnas”, enquanto Baptista Júnior tivera a ideia de entregar o cargo ao seu sucessor antes da posse do presidente eleito – acabou demovido da ideia. E Garnier? A delação do tenente-coronel Mauro Cid aponta que ao almirante coube o papel de garantir a prontidão de suas tropas para um golpe – aquilo que o atual comandante do Exército, general Tomás Paiva, chamou de “aventura maluca”.

Tomás já criticava Garnier muito antes de a delação de Cid se tornar conhecida. O general nunca perdeu de vista o episódio que ele qualificava como “ridículo”: o desfile de carros de combate do Corpo de Fuzileiros Navais pela Esplanada dos Ministérios no dia 10 de agosto de 2021, quando a Câmara iria votar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do voto impresso, que acabou derrotada. O desfile foi proposto a Bolsonaro pelo almirante.

Carreira

O almirante dizia se orgulhar de ter entrado na Marinha aos dez anos, em 1971 e, após mais de 900 dias passados no mar em fragatas, ter sido responsável por projetos na área de tecnologia da informação e comunicações na Força Naval. Guarda Marinha da turma de 1981, passou ainda pela comissão naval em Washington e assessorou quatro ministros da Defesa: Celso Amorim, Jaques Wagner, Aldo Rebelo – durante gestões petistas – e Raul Jungmann, no governo de Michel Temer (MDB).

No começo do governo Bolsonaro, em 2019, Garnier foi nomeado secretário-geral do Ministério da Defesa. Sua mulher e filho também ganhariam cargos – ela na secretaria-geral da Presidência e ele no Emgepron, a estatal da Marinha. Com a queda do almirante Ilques Barbosa, em 2021, Garnier assumiu a Força Naval. Foi quando Bolsonaro preencheu cargos da cúpula militar com oficiais de sua confiança.

O almirante voltou à carga contra as urnas eletrônicas em maio do ano passado, durante entrevista ao jornal O Povo. “Como comandante da Marinha, quero que os brasileiros tenham certeza de que o voto deles vai valer (…) O presidente da República é meu chefe; é o meu comandante. Ele tem o direito de dizer o que quiser.”

Garnier estava acostumado ao uso das redes sociais. Tinha 198 mil seguidores e quase 300 publicações. No dia seguinte ao segundo turno da eleição, escreveu: “Parafraseando o grande almirante Barroso, digo-lhes: ‘Não parem de lutar’”.

Ausência

As frentes dos quartéis se encheram de manifestantes enquanto, segundo o coronel Cid, minutas com decreto para um golpe de Estado eram apresentadas a Bolsonaro. Foi quando o tema teria sido tratado pelo então presidente com o almirante. O golpe não houve. E, em 30 de dezembro, Garnier publicou no Twitter mensagem para o almirante Marcos Sampaio Olsen, que assumiria a Força no governo Lula, desejando ao colega “bons ventos e boas águas”.

O desejo ficou restrito à rede social. Garnier se tornou o primeiro comandante da Marinha da Nova República a não comparecer à cerimônia de passagem de comando para seu sucessor. Queria demonstrar que não prestaria continência ao governo Lula. Ao deixar o serviço ativo, Garnier mergulhou no silêncio.

Após a revelação do teor da delação premiada de Mauro Cid, a Marinha divulgou nota na qual afirma “que eventuais atos e opiniões individuais não representam o posicionamento oficial da Força”.

Voltar

Compartilhe esta notícia:

Deixe seu comentário

No Ar: