Quinta-feira, 02 de maio de 2024

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Voltar A política do nós contra eles

Poucos assuntos causam mais polêmica ou acirram os ânimos quanto tributar a alguém a condição de fascista. Não é para menos, uma vez que o fascismo, originalmente surgido na Itália, em 1920, sob Benito Mussolini, cultivava ideais de nação e raça, em detrimento dos valores individuais, que descambaram para o autoritarismo despótico, a exemplo do próprio Mussolini, de Hitler e de alguns outros candidatos modernos a tiranos. Talvez pelo retorno extemporâneo desse tipo de pensamento político, o termo tenha voltado à cena em plena abertura do terceiro milênio, quando poderiam se julgar superadas as condições históricas que forjaram as tragédias fascistas do século XX.

Um dos estudiosos que tem se debruçado sobre o tema é o professor de filosofia da Universidade americana de Yale, Jason Stanley, autor do livro “Como Funciona o Fascismo”, já em sua oitava edição no Brasil. A obra guarda similaridade com muitas outras que vêm sendo escritas sobre os perigos que rondam os sistemas democráticos pelo mundo, a exemplo de “Como as democracias morrem”, dos professores também americanos, Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, ambos de Harvard. Diferente da abordagem de Levitsky e Ziblatt, que demonstram de forma muito clara como é que democracias estão sendo corroídas em seus mecanismos institucionais, Stanley olha um pouco mais para trás, para identificar no método fascista, o verdadeiro inimigo das democracias modernas.

Há, de acordo com o professor de Yale, alguns princípios fundamentais que caracterizam um modelo fascista, mecanismos tais apoiados simbioticamente, minando os pilares da democracia, pilares esses que justamente existem para conter a ascensão totalitária. Um dos primeiros desses princípios é a retórica nacionalista, envolta num passado místico, superado pela humilhação do globalismo, pelo cosmopolitismo e pelo respeito aos valores universais. Fixado o mito, na sequência, vem um vigoroso sistema de propaganda, geralmente em franco ataque ao sistema judiciário, tendo como pano de fundo a emoção fanática sobre o intelecto e o racional. Assim, arvoram-se, sem nenhum tipo de pudor, os arautos da liberdade de expressão para subvertê-la, geralmente com mentiras enquanto armas políticas.

Na mesma senda fascista, o anti-intelectualismo ataca e desvaloriza a educação, empobrece a linguagem, difama a igualdade, rebaixa as instituições de ensino superior, degrada os espaços de informação e oblitera a realidade. Postas em dúvida as universidades, o debate fundamentado é substituído pelos sentimentos do medo e da raiva. A realidade é trocada pelo discurso de um só indivíduo, com o domínio das teorias conspiratórias. Tais conspirações, nada inocentes, causam desconfiança generalizada e paranoia, justificando medidas drásticas tais como a censura, o fechamento da “mídia liberal” ou o aprisionamento dos “inimigos do Estado”.

No terreno da hierarquia social, o fascismo impõe escalas de poder e dominância em oposição a igualdade de respeito pressuposta pela democracia liberal. No âmago fascista, destacam-se a lealdade à tribo, à identidade étnica, à religião, à tradição, à nação. É o nacionalismo a serviço da dominação, em repúdio ao ideal democrático e liberal. Esse nacionalismo doentio está no cerne do fascismo, criando um “eles” perigoso contra quem temos que lutar. Nesse contexto, a retórica fascista usa o conceito de lei e ordem para dividir os seguidores das leis por natureza e aqueles que não fazem parte da nação escolhida. Na perspectiva fascista de ansiedade sexual, a hierarquia de gênero é centrada no homem, com a masculinidade sendo superior à feminilidade, com todo o corolário de preconceito decorrente a jusante. Em tempos como os atuais, nos quais tantas forças convergem para a segregação, para o divisionismo e para a intolerância, é imperioso estarmos alertas para os sinais de um fascismo renascido, cuja aniquilação da lógica racional humanista esteja cegando parte de nossa população, aderentes incontinentes e inconscientes dessa chaga destrutiva e insidiosa.

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